Desafios da maternidade: errar tentando acertar

Vamos para aquele papo de mãe? Não são poucas as vezes que nos questionamos, sentimos culpa e até refletimos sobre como temos desempenhado esse papel tão importante (talvez o mais importante de nossas vidas) que é ser mãe. Em meio a rotinas turbulentas, muitas vezes, optamos por atitudes que facilitam para nós e para nossos pequenos, mas que, nem sempre, são as melhores escolhas para o desenvolvimento deles. A psicóloga Camila de Souza conversou com a gente e nos ajudou a encontrar caminhos para uma maternidade mais leve e positiva para nós e para nossas crianças. Vamos acompanhar esse bate-papo?

Camila, é frequente que mães, no intuito de fazer o melhor para os filhos, acabem tomando atitudes que não são tão benéficas?

É normal que mães, pais e cuidadores se atrapalhem no dia a dia com as crianças. Afinal, ser orientador no desenvolvimento de uma criança não é uma tarefa das mais fáceis. Além disso, as crianças não seguem o script mental que nós adultos criamos e nós (adultos) não temos muitas habilidades emocionais para reconhecer e lidar com as nossas próprias limitações, sentimentos e necessidades, o que nos leva a agir de forma atrapalhada em algumas situações.

Correria do dia a dia, acúmulo de atividades, estresse no trabalho e crianças demandando atenção e auxílio, são um combo perfeito para aqueles comportamentos não muito benéficos ao desenvolvimento da criança e da sua relação com ela.

Todos nós, em cada fase da nossa vida, temos necessidades emocionais e de desenvolvimento que são básicas, como afeto, autoestima, autonomia, limites, etc. Como adultos, somos nós que atendemos e ajudamos as crianças a atenderem as suas necessidades básicas. Mas como fazer isso de forma assertiva, se não reconhecemos as nossas próprias necessidades e limitações?

Vamos ao exemplo prático

Sabe aquele dia que você tem uma reunião importante ou você está com o tempo contado e o pequeno está demorando para amarrar o cadarço ou para comer? Você pensa: vou me atrasar, não vai dar tempo! Assim, começa a ficar incomodada, começa a se apressar e apressar a criança. Dependendo do que “se atrasar” significa para você, você pode repreendê-la, pode fazer as tarefas por ela.

Agora, pense, você faria essas coisas se não tivesse irritada com seu atraso ou ansiosa com sua reunião?

Bem, a criança não entende que você está agindo assim porque VOCÊ está lidando com emoções desafiadoras para você. Ela associa a sua irritação com o comportamento dela e aí começam as dificuldades de autonomia, limites, autoestima e por aí vai. Claro que tem muitos fatores envolvidos, não estamos falando de causas e efeitos. Mas, sim, muitos dos nossos comportamentos atrapalhados com as crianças, estão associados a nossa própria falta de habilidade emocional.

Poderia citar alguns exemplos, explicando o porquê ao invés de ajudar atrapalham, Camila?

– O uso do celular ou tablet como troca de algo benéfico para o adulto.

– A falta de horários para dormir ou encerrar as atividades com eletrônicos.

– Uma rotina extremamente rígida, na qual a criança não pode se sujar, não pode ajudar, não pode fazer sozinha.

– Ou uma rotina demasiada flexível, na qual a criança pode tudo ou até mesmo negligente quando a criança precisa se virar sozinha (você fez, agora você limpa, você conserta, etc.).

Esses são comportamentos que impactam diretamente no desenvolvimento da criança, principalmente na construção dos limites e sentimento de estima (de ser amado). Toda a criança precisa aprender a conhecer os seus limites em relação ao outro e a si próprio, elas pedem por isso, elas testam os próprios limites e não o adulto. Esse comportamento não é por birra ou para incomodar, isso não é sobre você papai ou mamãe, é sobre ela estar conhecendo os seus próprios limites. Se nós como adultos não sabemos lidar com isso, vamos xingar, por de castigo ou até mesmo entregar o que a criança quer para nos livrarmos da situação.

O mesmo acontece com a autonomia e a validação, quando, por exemplo, a criança demora para tomar banho sozinha, faz muita sujeira para comer sozinha, não consegue amarrar o cadarço ou quer ajudar a secar a louça e acaba quebrando alguma coisa ou derramando algo no chão. São ações que facilmente tiram a paciência do adulto, gerando comportamentos atrapalhados como você dizer: deixa que eu faço isso sozinha, você não consegue fazer sozinho, você não presta a atenção nas coisas que faz, você demora demais. Parece nada demais, né? Mas é a assim que vamos tirando a autonomia da criança e ensinando que ela não é capaz de fazer as coisas sozinha.

Você diria essas coisas para um adulto na mesma situação?

E notem que, novamente, estamos falando das emoções que nós adultos sentimos na interação com a criança. Você não tem essa atitude por que não ama seu filho ou por que é uma péssima mãe, muito pelo contrário, você está tentando fazer o seu melhor, mas, assim como muitos adultos, tem dificuldades com as próprias emoções, limites e sentimentos.

Como podemos identificar e mudar essas atitudes?

Ficar atento ao que você está sentindo quando interage com o comportamento da criança. Por exemplo: eu estou com raiva, estou irritada, estou me sentindo impaciente? Eu já estava assim antes? O que eu preciso para lidar com isso agora?

Prestar atenção em você é muito importante, os seus limites, a sua necessidade. Se você não se reconhecer, ficará mais suscetível a agir de forma atrapalhada com o seu filho, gritando, criticando, fazendo por ele, não conseguindo ajudá-lo a lidar com suas emoções e, depois, você irá se cobrar por isso, vai se julgar uma péssima mãe, etc.

Percebe como é um ciclo? Só conhecendo você mesmo, você vai conseguir ajudar seu pequeno a se desenvolver. Invista no desenvolvimento do seu repertório emocional, no seu autoconhecimento.

Qual a sua dica final?

Aceitação. Aceite e reconheça que você erra, que você esta cansada, sobrecarregada, triste, com raiva. Seu filho não precisa de uma mãe ou um pai perfeito, ele precisa de afeto, carinho, atenção, humanidade.

Observe seu filho, conheça seu temperamento e a fase de desenvolvimento que a criança se encontra. As fases estimam o amadurecimento emocional, motor e cognitivo da criança, ou seja, nos dão mais ou menos o nível de estímulos e desafios que podemos lançar à criança. Respeitar esse limite de desenvolvimento é respeitar a criança, é ajudá-la a desenvolver sua autonomia, limites e autoestima (senso de capacidade da criança) de forma saudável.

Buscar orientação profissional também pode ajudar você. Saiba que tem profissionais que atuam com orientação de pais, ou seja, te ajudam a ajudar seu filho através de pequenas mudanças de atitudes e o resultado é você conseguindo construir uma relação saudável com base numa educação afetuosa e estimulante.

Dica de conteúdos sobre o assunto!

Consuma conteúdos sobre esse assunto, eles podem te ajudar a refletir, mas lembre-se que não existe receita, o que funciona para uma criança nem sempre funciona para outra. Dois livros muito legais e que falam sobre essas questões são: Eduque com carinho, da Lidia Weber, e Educação não violenta, da Elisama Santos.

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